Cicatriz Amorosa

Mariana D’Andretta relata marcas de relacionamento abusivo em “A Minha Vida no Seu Caos”

No livro "A minha vida no seu caos", de Mariana D'Andretta, uma mulher luta contra o estresse pós-traumático e o medo da denúncia após o fim de uma relação violenta

Publicado em 27/06/2023
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Quantas mulheres optam por não denunciar um agressor devido ao medo do julgamento social e de perder no tribunal contra o abusador? “A minha vida no seu caos”, escrito por Mariana D’Andretta, é um livro que aborda as consequências desse silêncio na vida das vítimas e os danos persistentes de um relacionamento abusivo mesmo após o término.

Na trama, Elena acredita ter conseguido escapar de Matías, seu ex-marido, ao mudar de bairro e trocar de emprego. Ela nunca compartilhou suas experiências perturbadoras com pessoas próximas, mas faz terapia regularmente. Apesar das crises de ansiedade e da baixa autoestima, ela acredita que os maiores problemas ficaram para trás, pois não tem mais contato com o agressor.

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Tudo muda quando Elena, arquiteta, começa um novo projeto nos bastidores de um filme sem saber que seu ex-marido, engenheiro civil, estará trabalhando no mesmo local. Os dois se encontram diariamente, e Matías faz de tudo para manipular a protagonista novamente. Embora ela acredite ser forte o suficiente para superar a situação, enfrentará grandes períodos de instabilidade.

Além de abordar a importância da denúncia, a autora também destaca a necessidade de uma rede de apoio para lidar com os traumas. Elena tem medo de contar para seus melhores amigos e irmã sobre o que passou, pois acredita que eles não entenderão. No entanto, são essas pessoas que darão força à protagonista para seguir em frente.

A obra é dividida de forma a explicar o início do relacionamento e a progressão das situações violentas. Os capítulos alternam entre passado e presente, narrados em terceira pessoa e pela perspectiva pessoal de Elena, respectivamente. Para criar uma representação fiel de um relacionamento abusivo e dos aspectos profundos do trauma, a autora contou com a leitura sensível de um psicólogo.

Segundo Mariana D’Andretta, o livro tem o objetivo de auxiliar as vítimas a lidarem com o estresse pós-traumático, o medo e a ansiedade. “A minha vida no seu caos” é destinado principalmente às mulheres, para que possam identificar os sinais de abuso e tenham coragem de denunciar caso se encontrem em situações semelhantes às da protagonista.

Mariana D’Andretta é graduada em Comunicação Social, com habilitação em Rádio, TV e Vídeo, e nasceu em São Paulo. Desde 2018, dedica-se integralmente à literatura, participando de antologias de contos e poemas. Em sua carreira de cinco anos, já colaborou em seis projetos realizados pela Lura Editorial e pelo Selo Off Flip. “A minha vida no seu caos” é sua estreia no romance e o primeiro livro de uma duologia, com a continuação prevista para lançamento em 2025.

Qual foi a inspiração por trás da escrita de “A minha vida no seu caos”?

Quando tinha uns 11 ou 12 anos, fiz uma viagem com a minha família à cidade litorânea de São Vicente, aqui no estado de São Paulo. Eu amo o mar, então, à noite, costumava olhar o mar pela janela. Numa dessas noites, me lembro de estar próxima à janela e escutar uma gritaria vinda dos andares de cima. Era uma discussão entre um casal, e, depois de um tempo, ela cessou. Fomos dormir e, no dia seguinte, prontos para ir à praia, pegamos o elevador. Quando entramos nele, havia um casal dentro. Olhei para os dois, curiosa, e percebi que, na mulher, havia um hematoma ao redor do olho, que ela escondia com um óculos de sol. O homem parecia não estar nem aí.

Essa história me fez pensar no depois, no que havia acontecido com essa mulher. Se ela havia se separado ou continuado com o marido, se ela estava viva ou morta. Claro que essa lembrança veio muito tempo depois, comigo já adulta, e ela se juntou com as notícias da TV e da internet, com as conversas que tive e escutei. Tudo se encaixou para que pudesse criar a história como ela é.

Por que você decidiu abordar o tema do relacionamento abusivo e suas consequências no livro?

É o depois que ficou na minha cabeça após a história de São Vicente. Eu gostaria realmente de saber como aquela história continuou, como tantas outras histórias continuam, então criei a minha versão. Precisamos continuar mostrando o ato do abuso no audiovisual e na literatura, mas precisamos abrir mais espaços para falar sobre as consequências dele, o quanto é nocivo e não termina só porque o relacionamento acabou. Os traumas continuam ainda mais se o agressor voltar. Não haverá cura sem a ajuda apropriada.

Qual é a importância de discutir a questão do silêncio das vítimas de abuso e o medo do julgamento social?

Infelizmente ainda nos deparamos com um tabu onde a vítima/mulher sempre é taxada como louca se fala algo que a incomoda. Então é preferível se calar. Fomos criadas para aguentar tudo. Sempre a culpa é da mulher, ela provocou e fez por merecer. Com a Elena, isso não foi diferente: ela sentiu o peso, o que a fez tomar decisões erradas.

Como você abordou a construção do relacionamento abusivo e os aspectos do trauma na história?

Dividindo a história entre presente e passado. No presente, vemos Elena lidando com os traumas acarretados do relacionamento abusivo junto ao retorno de Matias. No passado, vemos desde quando eles se conheceram até o momento em que ela sai de casa.

Mariana D’Andretta (Foto: Divulgação)

Qual é a mensagem principal que você deseja transmitir às leitoras sobre identificar os sinais de abuso e buscar ajuda?

Temos cinco tipos de violência contra a mulher que se enquadra na Lei Maria da Penha: a física, a sexual, a psicológica, a moral e a patrimonial. Quando você lê “A minha vida no seu caos”, você consegue identificar os cinco tipos, uns mais fortes do que os outros, mas todos estão ali. Um livro de ficção também pode ser uma grande fonte de informação. Portanto, busque sempre por informação, seja pela internet ou com alguém. A informação te mostra que você tem direitos e, mesmo com toda a dor, vale a pena buscar por eles.

Como a protagonista Elena lida com o estresse pós-traumático, o medo e a ansiedade na história?

Bem, a Elena desenvolveu certos “distúrbios” resultantes dos abusos. Para ela, é mais fácil lidar com a dor física do que com a emocional. Portanto, quando a dor fica insuportável, ela se machuca. Além de não se sentir mais segura na maioria dos lugares. Então ela optou por se afastar da sociedade – sua casa e o trabalho são os únicos locais em que se sente bem, e tem algo dentro dela que a faz querer provar para si mesma que ainda está viva. Por isso, Elena acaba se levando ao limite em certas situações e se colocando em perigo.

Como foi a colaboração com o psicólogo para garantir a fidelidade na abordagem dos aspectos psicológicos do trauma?

Através da Leitura Sensível, eu escrevi o manuscrito da história e pedi para que o Dr. Daniel lesse e me indicasse quais pontos poderiam estar exagerados e quais pontos poderiam ser mais bem trabalhados para que se aproximasse da realidade. No fim, eu consegui mostrar bem como uma vítima de abuso e estresse pós-traumático pode se comportar.

Além de incentivar as vítimas, você também mencionou a importância de uma rede de apoio. Como você aborda esse tema no livro?

A rede da Elena consiste em apoio psicológico. Ela faz psicoterapia desde que se separou e tem o apoio dos melhores amigos e da irmã caçula, que sempre estiveram ao seu lado. O importante é ter alguém de confiança para conversar e se abrir, esse é o primeiro passo.

Como a sua formação em Comunicação Social influenciou a sua escrita literária?

Meu avô materno foi a minha figura de referência nas artes. Ele trabalhou com vídeos institucionais. Então, na cada dele, tinha uma câmera de filmagem que ele gravava os vídeos caseiros da família, projetores de filmes e de fotos e filmes famosos de Hollywood. Eu cresci nesse meio, aquilo era fantástico para mim. E isso me fez ir para Rádio e TV, pois eu sempre soube que seria escritora, desde criancinha mesmo. Quando estava na casa do meu avô, eu imaginava as minhas histórias feitas, primeiro, em livros para depois ir para as telas do cinema. E, por isso, resolvi trazer um pouco do que é os bastidores de um filme para a história de “A minha vida no seu caos”, uma homenagem à graduação que tenho tanto orgulho e ao meu avô.

Podemos esperar mais obras abordando temas relevantes e sensíveis como esse no futuro?

Com certeza! Cada escritor tem uma missão, seja fazer o leitor rir, se amedrontar, chorar, suspirar… Acredito que a minha missão seja fazer o leitor refletir e questionar. Abordar temas relevantes e sensíveis é o que mais me motiva a escrever.

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