No mês de agosto, Rensga Hits chegou à plataforma de streaming Globoplay. A série ganhou enormes proporções positivas nas redes sociais, definitivamente já declarada um sucesso comercial da Globo em 2022 – podendo, inclusive, ocupar um possível posto de melhor produção da casa.
Como resultado da aprovação popular dos telespectadores, a renovação de Rensga Hits para uma segunda temporada está mais que formalizada, podendo iniciar os primeiros preparativos para a metade de 2023. Na melhor das hipóteses, sua finalização pode ser agendada para o primeiro trimestre de 2024 na Globoplay
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Para quem ainda viu a série, Alice Wegmann é a protagonista Raíssa Medeiros na história de Rensga Hits, uma mulher que utiliza de um dos piores momentos de sua vida – a descoberta de uma traição de seu marido no dia de seu casamento – como um motor de coragem para seguir seu maior sonho: virar uma cantora sertanejeira.
Raíssa (Alice Wegmann), ainda com o vestido de noiva em seu corpo e seu violão, viaja à Goiânia para seguir sua paixão, e é claro que diversas reviravoltas e imprevistos acontecem no meio, como em qualquer produção melodramática.
Porém, o que chama atenção sobre esse cenário é que Rensga Hits diferencia-se logo na sua ideia, fugindo do Sudeste como palco principal e dos temas de disputas empresariais ou dos dramas policiais, migrando no sul do país, em Goiânia, para homenagear o mercado da música sertaneja.
De certa forma, é curioso pensar que o sertanejo, mesmo sendo o gênero musical mais escutado entre os brasileiros por 2 anos seguidos – e já forte antigamente, nos anos 90, com uma pegada mais romântica em suas canções e cabelos mais longos dos musicistas – ainda não conseguiu ter seu palanque nos cinemas e na televisão como devia.
O feminejo, nova vertente do sertanejo ganhando cada vez mais autoridade dentro do nicho, é popular, pelo menos, desde 2016 – com Marília Mendonça como precursora – o que mostra um “atraso” bastante notável da Globo na inclusão do sertanejo em suas produções.
É exatamente pela empolgação vinda do grupo de sertanejeiros do Brasil pela obra retratar sobre esse mundo, somado com o “arroz com feijão” feito no roteiro, que tornaram Rensga Hits o nome do momento.
Os bastidores da música sertaneja e sua potência como pautas, encravam o estilo cada vez mais nas mídias e, por sua vez, permite que novas pessoas dêem a chance de incluir o sertanejo em suas playlists e produtoras abram seu leque quanto a histórias envolvendo a cultura sertaneja.
Rensga Hits e seu Papel de União e Denúncia
Rensga Hits aposta no paralelo entre a trama de uma jovem que não poupa medidas para seguir seu sonho e seu encaixe em um universo muito mais complexo da música, com tensões que envolvem a tentativa de obtenção de lucro a todo custo e a alta concorrência no meio.
Dentro desses pólos, o seriado valoriza e critica ações dentro da indústria bastante importantes, um trabalho bem feito pelo time de roteiristas Renata Corrêa, Bia Crespo, Nathalia Cruz, Victor Rodrigues e Otavio Chamorro.
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Feminejo e Feminismo
O grande pilar de Rensga Hits é a hegemonia do Feminejo, que permitiu uma maior inserção de cantoras nesse meio predominantemente repleto de referências de homens.
Mesmo com as músicas cantadas por mulheres ocupando os maiores hits no Brasil, ainda não chegamos em uma pluralidade desejável dentro dessa indústria.
Ao invés da mesmice de apontar o dedo no machismo e apresentar uma menina que será a exceção fora da curva, o universo de Rensga Hits já insere uma visualização de um mercado muito mais aberto e composto por mulheres.
O público está, muita das vezes, cansado de criticar as problemáticas, somente querendo se imaginar em um mundo que se encaixe com que acredita; ou desejando escapar deles.
A medida não só reflete o que está acontecendo atualmente, mas também possibilita deixar mais normalizado- como definitivamente já é – as mulheres ocupando tais cargos e já de antemão expressar suas denúncias de maneira mais clara e potente.
Os maiores exemplos dentro de Rensga Hits são os papéis de Déborah Secco e Fabiana Karla como grandes chefes das produtoras musicais rivais de sertanejo, posições que majoritariamente um homem ocupa. Desde o início do seriado, as duas personagens já estão no posto, já contentando que são mulheres poderosas e que sabem o que estão fazendo.
Mesmo caso de Gláucia, cantora interpretada por Lorena Comparato, que já chega como uma cantora muito promissora.
Outro caso, desta vez denunciando o machismo, é a personagem Thamires (Jeniffer Dias), cantora de uma dupla sertaneja ao lado de seu irmão gêmeo, Theo (Sidney Santiago).
Mesmo sendo mais habilidosa que Theo, Thamires se depara com seu irmão ganhando mais que ela, vivendo um dilema pessoal entre o desmanche da dupla – um núcleo familiar que pesa na consciência e o medo do recomeço – ou simplesmente a conivência da personagem perante o ocorrido.
Por último, Rensga Hits conseguiu falar sobre a própria concepção do Feminejo, que embora seja uma vertente, por estar nos grandes holofotes graças ao legado de Marilia Mendonça, não é mais apenas um subgênero.
Sua representantes contribuem para tal afirmação, porém toda a pauta de igualdade das mulheres em um meio ainda bastante conservador ganha apelo e mais honra nessa batalha.
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Outros estilos de sertanejo
Há outros estilos do sertanejo presentes em Rensga Hits, ambos com notoriedade crescente nos tempos de hoje, como o sertanejo mais “safado” de Deivid Cafajeste (interpretado por Alejandro Claveaux, paródia do icônico Wesley Safadão) e o mais apaixonante ilustrado pelo astro juvenil Enzzo Gabriel (com Maurício Destri dando a vida ao personagem, que pode ser uma referência ao Luan Santana).
Isto mostra as diversas facetas que o sertanejo pode migrar, tornando-o super rico e moldável.
Essa amostra em Rensga Hits também pode fazer com que estes novos tipos de nichos sejam conhecidos pelo público antigo ou novo dentro do sertanejo, com maiores tendências para o público recém-chegado no gênero dar uma chance ao estilo, que remete mais uma pegada de pop.
Todos os estilos são conectados!
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Presença de artistas em Rensga Hits
Em uma produção audiovisual que fala sobre o mundo do sertanejo, como Rensga Hits, fica claro que os envolvidos por trás e em frente às câmeras tinham que ter autoridade acerca do assunto.
No por trás das filmagens, grandes nomes do sertanejo participaram ativamente na história e, principalmente, nas músicas originais de Rensga Hits.
Dudu Borges, grande produtor que gerenciou as carreiras de Michel Teló, Luan Santana, Bruno Marrone, Paula Fernandes, Marília Mendonça e outros; atuou como um conselheiro para os atores da série, para tanto os artistas compreenderem os seus respectivos papéis quanto na ideologia dos personagens frente ao mercado do sertanejo.
A parte musical não faltou a desejar, com uma equipe de compositores escolhidos a dedo pela produção de Rensga Hits, tendo em vista que não predomina somente o Feminejo.
Grandes craques foram os escolhidos para escreverem as músicas autorais do seriado, como Gabriele Oliveira Felipe (conhecida como Bibi) – que inclui composições com a Anitta, Pablo Vittar e Luisa Sonza -; Gabriel Agra – compositor das músicas “Alô Ambev”, “10%” e “Bebi Liguei” de Zé Neto & Cristiano, Maiara & Maraísa e Marília Mendonça, respectivamente – e Paula Mattos – cantora com mais de 400 músicas escritas para Thaeme & Thiago, Wesley Safadão, Matheus & Kauan, Michel Teló, Zé Felipe e Munhoz & Mariano.
A dupla Day & Lara, Cesar Lemos e Davi Ávila (dupla com Bruninho) também foram chamados. Logo, as músicas cantadas pelos atores de Rensga Hits nada mais é que novas músicas 100% sertanejas profissionais lançadas em um formato fora do habitual. Ao todo, mais de dez músicas foram escritas para Rensga Hits.
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Críticas do mercado
Rensga Hits é muito útil em apontar falhas sobre o mercado da música sertaneja.
O seriado utilizou de seus personagens como forma desse rebate. Um dos mais claros é a trama de Deivid Cafajeste (Alejandro Claveaux) juntamente entrelaçada com seu amigo e compositor Isaías (Mouhamed Harfouch).
Deivid faz sucesso em Rensga Hits cantando músicas mais quentes e sensuais, com aquele toque de ser o cara que vai dar chifre no outro. Com isso, Deivid é também mega sensualizado para cativar seu maior público: as mulheres solteiras.
Porém, Deivid, secretamente, não gosta dessa postura, criada somente para faturar mais dinheiro. Na verdade, Deivid é sexualmente atraído por homens, e tem que manter em sigilo seu amor à primeira vista com seu segurança Kevin Costa (Samuel de Assis).
Isaías entra nisso por colaborar com a hipersexualização e estereótipo de Deivid para com seus fãs, escrevendo somente letras envolvendo safadezas, sacaneadas por Raíssa (Alice Wegmann) em Rensga Hits como “sem vida”, que contribui pro compositor sofrer com a autoconfiança.
O desenvolvimento de Deivid questiona o lugar não-seguro de um cantor sertanejo LGBTQIA+ no mercado musical, tendo em vista que os maiores representantes do gênero são brancos e heterossexuais, que moldou o público para uma classe mais conservadora.
Thamires & Theo (Jeniffer Dias e Sidney Santiago) são outros que podem seguir o mesmo adendo ao Deivid em Rensga Hits
Ao invés da pauta sexual, o questionamento racial foi levantado. Pouquíssimos artistas negros cantam sertanejo, fazendo com que Rensga Hits possa despertar essa coragem no mercado para trazer mais pretos protagonistas. Igualmente entrelaçada com uma dupla de diferentes gêneros: um homem e uma mulher, não comumente visto por aí.
Também são vistos, como forma de contornar problemas enfrentados em Rensga Hits, a invenção de namoro falso entre o Enzzo Gabriel (Maurício Destri) e Thamires para desviar das notícias de uma possível separação da dupla Thamires & Theo.
A utilização de meios nada convencionais para solucionar uma dor de cabeça, visto em Rensga Hits, não se importando com a vida pessoal de seus artistas, é de praxe em qualquer meio empresarial.
O que piora a sentença é que os produtos, no caso, são os próprios cantores, que não podem fazer nada. Ou porque são submetidos a abusos de poder e assédio moral, ou pois está no contrato, podendo ser demitido por justa causa e com uma reputação manchada.
Enzzo Gabriel é utilizado em Rensga Hits para nortear o problema da criação de ídolos jovens. Por ainda serem novos, é eminentemente que façam algumas coisas mais complicadas, mas é porque ainda possuem a inocência e imaturidade característico com a idade.
Mesmo que façam um trabalho que amem, o excesso de tarefas, a preocupação constante com a estética, números ditando suas capacidades e um meio altamente agressivo e concorrido acabam sendo pesos severos na saúde mental do artista, dobrando as sequelas quando o próprio cantor é novo.
Tudo praticamente se move, em Rensga Hits, pela ganância e na tentativa de sempre querer estar acima dos outros, ambientada não só pela rivalidade da guerra empresarial entre as produtoras Rensga Hits de Marlene (Déborah Secco) e Jóia Maravilha Records de Helena (Fabiana Karla), mas igualmente envolvendo a personagem Gláucia (Lorena Comparato), que sempre quer passar a perna em Raíssa (Alice Wegmann), temendo que ela roube seu lugar precioso como estrela da produtora.
Rensga Hits acrescenta e sugere alterações na indústria do sertanejo no Brasil, aproveitando a crescente informação e aceitação do diferente para inovar cada vez mais o gênero.
Em um mercado que está somente agora se tornando viável para as mulheres, o seriado condena que homens de outras raças e orientações sexuais também tenham acesso ao benefício.
De quebra, a série faz seu papel e produz ainda mais no ramo, garantindo seu lugar de fala.
Muitos podem dizer que é nichado ou simplesmente não gostarem, entretanto é indiscutível que Rensga Hits é essencial para todos os públicos: desde os mais novos, que ainda não possuem contato com o sertanejo ou somente é afinado; a grandes consumidores do gênero, para que tanto entendam os bastidores e o funcionamento de um produto que amam, quanto aprendam a apoiar e enxergar furos e desatualizações presentes no mercado.
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