Assim como a premiação de 2020 que vem sendo acusada de racismo, a edição de 2019 do Grammy, foi em parte ofuscada por seus bastidores que pareciam estar mais interessantes do que a premiação em si. Em janeiro aconteceu mais uma edição da entrega do prêmio mais importante da indústria musical norte-americana. Nas vésperas do evento, a ex-presidente Deborah Dugan, que foi afastada do cargo em licença administrativa, aproveitou o timing para fazer sérias denúncias de fraude nas indicações.
Segundo informações do prestigiado veículo musical Pitchfork, o advogado da ex-presidente afirmou que dentro do Grammy acontecem muitas ações consideradas anti-éticas com casos de corrupção, racismo e até abuso sexual. A antiga funcionária do evento revelou que os membros do conselho indicam com frequência artistas com quem tem conexão ou interesse para que possam assegurar que certas músicas sejam impulsionadas nas rádios e streaming, melhorando seu desempenho.
Deborah Dugan contou também que teria acontecido uma fraude nas indicações de “Canção do Ano” na edição de 2019 e que artistas que tinham sido mais votados, como por exemplo Ariana Grande e Ed Sheeran, teriam sido simplesmente ignorados e substituídos por outros músicos que estavam em posições muito inferiores.
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Em seu discurso, Deborah também explica que os dirigentes do Grammy Awards endossam um posicionamento extremamente racista, afirmando que dificilmente artistas do R&B e Rap (predominantemente negros) acabam saindo vencedores das principais categorias da premiação, como Música, Gravação e Álbum do Ano. A rejeição aconteceria mesmo com nomes consagrados pela crítica e público, como Beyoncé, Kendrick Lamar e Kanye West. No processo, há argumentos de que membros negros da Academia eram expulsos da equipe por falar da falta de diversidade do Grammy Awards.
Vale lembrar que em 2017, o Grammy Awards foi massacrado por críticos musicais e internautas por ignorar em indicações e premiações principais, os álbuns ANTI da Rihanna e Lemonade, de Beyoncé. Com toda a repercussão das denúncias de racismo em janeiro, internautas resgataram um vídeo de Adele discursando emocionada ao receber o prêmio de Álbum do Ano pelo último disco “25”.
“Eu não posso aceitar este prêmio. (…) A artista da minha vida é Beyoncé, e o álbum ‘Lemonade’ é tão monumental (…) e tão bem pensado e tão bonito e tão revelador, que todos nós vimos um lado seu que nem sempre você nos deixa ver, e nós agradecemos por isto. E todos nós, artistas, amamos você. Você é a nossa luz!.” Houve na web, na ocasião, muita gente sugerindo que a própria Adele assumiu publicamente que Beyoncé merecia o prêmio mais do que ela própria.
A Academia musical chegou a enviar uma nota em resposta às acusações de preconceito para a revista Variety comentando sobre as investigações, mas se abstendo de abordar as acusações de fraude no processo de escolha dos indicados e vencedores.
“É curioso que a Sra. Dugan nunca deixou claras essas graves alegações até uma semana depois que as queixas legais foram feitas contra ela pessoalmente por uma funcionária que alegou que a Sra. Dugan havia criado um ambiente de trabalho tóxico e intolerável e engajado em conduta abusiva e de bullying. Quando a Sra. Dugan falou sobre seus incômodos ao RH, ela especificamente instruiu o RH a ‘não fazer nada’ em resposta. De qualquer forma, nós imediatamente iniciamos investigações independentes para rever tanto a potencial falha de conduta da Sra. Dugan quanto as subsequentes alegações. Ambas as investigações continuam em curso. A Sra. Dugan foi afastada administrativamente apenas depois de oferecer seu posto e demandar US$ 22 milhões da Academia, que é uma organização sem fins lucrativos. Nossa lealdade sempre será aos 25 mil membros da indústria musical. Nós sentimos muito que a maior noite da música esteja sendo roubada deles devido às ações da Sra. Dugan e estamos trabalhando para resolver esta questão o mais rápido possível”.
Beyoncé, vale lembrar, é a recordista absoluta em número de indicações na história do Grammy (60 indicações). Mesmo assim discos que ajudaram a definir e moldar os caminhos da indústria musical como Beyoncé (2013) e Lemonade (2016) não foram premiados na categoria “Álbum do Ano” nos anos em que foram indicados. A esposa de Jay-Z, na verdade, nunca foi premiada nesta que é considerada uma das principais da cerimônia que é a honraria máxima da indústria musical.
Em suas 59 edições, apenas 12 artistas negros venceram o prêmio mais cobiçado, ‘Álbum do Ano’, sendo que três destes foram para Stevie Wonder.
A primeira mulher vencedora do prêmio foi Judy Garland no ano de 1961, enquanto a primeira negra vencedora só acabou sendo reconhecida no anode 1992. Vale ressaltar que nesta fase tivemos símbolos da música afro mundial como Nina Simone, Aretha Franklin e a própria Ella Fitzgerald.
As únicas três negras que chegaram a vencer um prêmio Grammy de álbum do ano foram Natalie Cole (por Unforgettable… with Love’ de 1992), Whitney Houston, pela trilha sonora de ‘The Bodyguard’ (1994) e Lauryn Hill pelo disco ‘The Miseducation of Lauryn Hill’ (1999).
Na edição deste ano, três dos cinco finalistas a Álbum do Ano foram negros, sendo as cantoras H.E.R e Lizzo, com seus álbuns I Used to Know Her e Cuz I Love You, respectivamente, e o rapper Lil Nas X, com a obra 7. O prêmio, contudo, acabou ficando com a adolescente caucasiana Billie Eilish.
Vale lembrar também que Michael Jackson venceu pelo clássico Thriller em 1984, Lionel Richie conquistou também em 1985 e o hitmaker Quincy Jones em 1991 pelo disco “Back on The Block” que ele produziu com a participação de vários artistas, incluindo Ella Fitzgerald, Ice-T, e Ray Charles. Já no ano de 2004, o duo Outkast ganhou o álbum do ano em 2004 por “Speakerboxx / The Love Below”.
Porém nos quase últimos 20 anos da premiação, em somente duas edições do Grammy, 2001 e 2011, não houve nenhum artista negro concorrendo em ‘Álbum do Ano’. Porém, mesmo assim, o último músico afro-descendente que venceu foi Herbie Hancock, em 2008 trazendo uma compilação de vozes e diferentes artistas no disco ‘River: The Joni Letters’. O projeto conta com vozes negras como Tina Turner, Corinne Bailey Rae mas, traz artistas caucasianas como Norah Jones também.