Em 8 de dezembro de 1980, o ex-vocalista dos Beatles, John Lennon foi brutalmente assassinado por um fã. Entretanto, o que poucos sabem é que dois meses antes do fatídico dia, um empresário paulista teria encontrado o icônico cantor. Por André Bernardo, do BBC.
Há 40 anos, o músico e empresário Marco Antônio Mallagoli, então com 27 anos, meteu na cabeça que queria passar o aniversário de 40 anos de John Lennon, no dia 9 de outubro de 1980, ao lado do ídolo. Fácil não seria, pensou. Mas, não custava tentar. Alguns amigos tentaram dissuadi-lo da ideia: “Cara, ele odeia fã. Vai cuspir na sua cara!”, argumentaram os mais exaltados.
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Mallagoli deu de ombros. Fã dos Beatles desde 1963, quando ouviu, pela primeira vez, uma canção do quarteto inglês, tomou as devidas precauções: a primeira delas foi arranjar um canto para ficar em Nova York.
Não poderia ter encontrado um lugar melhor: Osni Omena, o primo de um amigo que curtia os Fab Four, morava na rua 71, a um quarteirão do Dakota, o prédio em que Lennon e a mulher Yoko Ono, moravam, e lhe abriu as portas do apê.
O passo seguinte foi providenciar um presente para o aniversariante: um exemplar de Os reis do iê-iê-iê (1965), a versão brazuca da trilha-sonora do filme A hard day’s night (1964), com dedicatória e tudo.
Mallagoli chegou a Nova York por volta do dia 5 de outubro. Todos os dias, ele passava uma média de oito horas, das quatro da tarde à meia-noite, na frente do Dakota.
Na esquina da rua 72 com a Central Park West, em Manhattan, o Dakota entrou para a história como o edifício residencial mais famoso do mundo.
Com pé direito alto, paredes revestidas em mogno e chão de mármore, o lugar abrigou astros e estrelas, como a atriz Judy Garland (1922-1969), o bailarino Rudolf Nureyev (1938-1993) e o casal John Lennon e Yoko Ono, que se mudou para lá em 1973.
“Nos anos 1980, o Dakota tornou-se um dos points turísticos mais badalados de Nova York. A qualquer hora do dia ou da noite, havia curiosos na porta do edifício, querendo ver seus moradores ilustres”, relata Omena, que mora em Nova York desde o verão de 1980 e trabalha como designer 3D.
Em pouco tempo, Mallagoli tornou-se “amigo de infância” de um dos porteiros do Dakota, o cubano José Perdomo, de 45 anos. Para selar a amizade, deu de presente a ele “um maço de cigarros e uma garrafa de cachaça”. Em retribuição, pediu a gentileza de entregar ao morador mais ilustre do prédio o LP que trouxera do Brasil.
No grande dia, o do aniversário de John Lennon, Mallagoli não era o único a querer dar os parabéns ao ídolo. Uma pequena multidão se formou na frente do Dakota.
A certa altura, o pequeno Sean, que faz aniversário no mesmo dia em que o pai, berrou da janela do sétimo andar: “Há uma surpresinha pra vocês na portaria!”.
O ex-beatle havia providenciado fatias de bolo, embrulhadas em papel alumínio, e balões coloridos autografados para os fãs.
Em vez de pegar seu pedaço, Mallagoli puxou conversa com o sujeito que trouxera os presentes. Quando descobriu que se tratava de Frederic Seaman, secretário particular do artista, perguntou se o aniversariante tinha gostado do presente que lhe dera na véspera. “Ah, então, foi você?”, espantou-se. “John já ouviu umas três vezes. Há muito tempo ele não ouvia um disco dos Beatles…”, disse.
Nessa hora, Mallagoli encheu-se de coragem para perguntar se não daria para ele subir um pouquinho e, quem sabe, conhecer o ídolo de perto. “Não, não daria”, respondeu Seaman.
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No dia seguinte, Mallagoli estava lá, de novo. Deu de cara com uma limusine, estacionada na porta, com o motor ligado. “Ele deve sair a qualquer momento”, pensou. Não deu outra. Dali a pouco, a moça com quem Mallagoli conversava emudeceu e arregalou os olhos.
Era a senha. Atrás dele, John Winston Ono Lennon, com seu indefectível óculos de aro redondo.
Sem perder tempo, Mallagoli se apresentou como o presidente do fã-clube Revolution, do Brasil. John retribuiu o cumprimento, agradeceu pelo presente e os dois começaram a conversar.
“Por que você nunca foi ao Brasil?”, Mallagoli puxou conversa. “Por que nunca me convidaram”, respondeu John. “Então, a partir de agora, considere-se convidado”, sorriu. Em seguida, Mallagoli quis saber se Lennon estava trabalhando em algum novo disco. “Sim, ele vai se chamar Double Fantasy“, respondeu, referindo ao seu quinto álbum de estúdio, lançado em novembro de 1980. Pouco depois, contou alguns de seus planos para o futuro: lançar outro álbum, Milk and Honey, no comecinho de 1981 e, em seguida, sair em turnê pelo Japão, Europa, EUA… “E Brasil”, interrompeu Mallagoli. “Pois é, e Brasil”, concordou o cantor.