Após emocionar o público paulista em sua primeira temporada — marcada por sessões esgotadas e forte repercussão — “Lady Tempestade” segue em nova temporada no Teatro FAAP, de 8 de agosto e 5 de outubro. Estrelado por Andrea Beltrão, o espetáculo lança luz sobre uma história pouco conhecida da ditadura brasileira, propondo um diálogo entre arte, política e memória coletiva. Em junho, a montagem celebrou a marca de 100 apresentações, reafirmando sua potência cênica e o impacto com o público.
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Andrea Beltrão surge de biquíni e corpo de 'boneca' impressionaPraia agitada: famosos se exercitam e aproveitam o dia ensolarado no Rio de JaneiroAndrea Beltrão surge de maiô na praia em momento de reflexãoCom direção de Yara de Novaes e dramaturgia de Sílvia Gomez, o espetáculo traz à cena a história da advogada pernambucana Mércia Albuquerque (1934-2003), que atuou na defesa de presos políticos durante a ditadura militar no Brasil. Um relato potente, que articula passado, presente e futuro, ao abordar a luta por justiça e memória em um país que insiste no esquecimento.
Na trama, Andrea interpreta A., uma mulher que recebe, de forma inesperada, os diários de Mércia e se vê atravessada pelos relatos de coragem e resistência. O impacto desse encontro provoca reflexões sobre os ciclos de violência, a urgência da memória e os desafios da justiça social — temas que seguem absolutamente atuais.
Yara e Andrea buscavam um texto para trabalharem juntas, sem tema pré-definido. A diretora de “Lady Tempestade” tinha participado como atriz do elenco de “Zé”, filme de Rafael Conde sobre o militante mineiro José Carlos Novaes da Mata Machado, assassinado no DOI-CODI do Recife em 1973. Ali, soube da existência de Mércia, porque foi a advogada que conseguiu localizar o corpo da vítima, promover a exumação e a transferência para Belo Horizonte.
Ao pesquisar sobre a história de Mércia, Yara chegou a Roberto Monte, que dirige o Centro de Direitos Humanos e Memória Popular, no Rio Grande do Norte. Foi a ele que Octávio, marido da advogada, confiou os arquivos após a morte dela, em 2003. Além dos diários, há cartas e processos no acervo. Citado na peça como R., a pessoa que envia a encomenda para A., na vida real Monte de fato mandou os escritos da pernambucana para Yara e Andrea antes mesmo de publicá-los, em meados de 2023, no livro “Diários de Mércia Albuquerque: 1973-1974” (editora Potiguariana).
“Foi um susto”, conta Yara, ao lembrar da reação ao receber e ler o diário. Em seguida, elas tiveram acesso também a uma entrevista em áudio de Mércia para Samarone Lima, autor da reportagem biográfica “Zé: José Carlos Novaes da Mata Machado”.
A opção de levar essa história aos palcos veio, por coincidência, após seu monólogo “Antígona”, montagem sobre o clássico de Sófocles em que a protagonista desafia a ordem do rei Creonte de deixar seu irmão, que lutou na guerra, insepulto. Andrea levou o prêmio APCA de melhor atriz pela peça, que se desdobrou também em livro e no filme “Antígona 442 a.C”. Agora, retoma o tema da luta por justiça, e pelo sepultamento digno de entes queridos, em “Lady Tempestade”.
“Mércia dizia que era uma contadora de histórias de pessoas que reconstruíram a liberdade. Eu sou uma contadora de histórias. Eu acredito que contar histórias é uma maneira amorosa de pensarmos juntos no nosso passado, nosso presente e nosso futuro. Contar histórias amorosamente, para nunca esquecer. Para tentarmos responder às perguntas que nos fazemos aqui e agora.”, reflete Andrea.
Ao fazer paralelos com o tempo presente — com direito a um desabafo verídico, em áudio, de uma mãe que teve o filho assassinado pela polícia em 2022 —, A. envolve a plateia numa questão angustiante, mas provocadora: se não dá para “desver”, o que podemos fazer com isso?
À medida que a dúvida se torna parte do enredo, foi natural para Silvia Gomez adotar uma ideia dada por Yara: narrar a história como se fosse o diário de A. lendo o diário de Mércia. “A personagem da Andrea diz: queria fingir que não tinha recebido aquilo, mas não era mais possível. Eram coisas semi-desaparecidas e não são mais. Então, para que futuro vamos após ouvir as palavras de Mércia?”, indaga a autora.
Não à toa, uma frase é repetida algumas vezes no texto, após a leitura de trechos dramáticos do diário de Mércia: “Essas coisas acontecem, aconteceram, acontecerão”. Silvia desenvolve: “Alguém do presente, como nós, recebe uma convocação do passado. De repente, na escrita, o tempo verbal tornou-se arisco: às vezes no passado, às vezes no presente, às vezes no futuro. Como se a forma pedida pela obra nos lembrasse que o Brasil é reincidente no esquecimento de sua história, tantas vezes parecida com uma cena em looping de terror”.
A “virada da heroína” acontece, nas palavras de Silvia Gomez, quando Mércia vê o militante Gregório Bezerra ser torturado no meio da rua, em 1964. Recém-formada em Direito, ela chegou em casa e comunicou ao marido que iria defender aquele homem e quem mais precisasse. Mesmo tendo defendido mais de 500 pessoas e ser considerada a maior advogada nordestina de presos políticos durante a ditadura militar, Mércia ainda é pouco lembrada. “Isso chama a atenção pois, de modo geral, tantos homens são celebrados com nome e sobrenome por seus feitos heroicos”, observa Silvia. “O sistema trabalha muito bem para certos nomes serem apagados.”
A partir dessa ideia de uma atuação heroica, a seu modo, e de uma frase de Mércia em que ela se compara à mãe — “minha mãe é bonança, eu não, sou tempestade” —, surgiu o apelido que deu nome ao espetáculo. “As pessoas que entrevistamos disseram que ela tinha um olhar muito forte, olhar de relâmpago”, conta Silvia, que escreveu o texto também inspirada por conversas com mulheres como a jornalista e prima de Mércia, Eliane Aquino, a juíza Andrea Pachá e a escritora e ensaísta Helena Vieira e por canções de artistas como Ceumar, Linn da Quebrada, Beyoncé, Kae Tempest. “Usar o nome Lady Tempestade foi uma forma de trazer Mércia para o presente, onde ela nos confronta com o futuro.”
O texto da peça ganhou uma versão literária, pela Editora Cobogó. Além do texto integral da peça, a edição inclui uma apresentação da autora e textos de Yara de Novaes, Andrea Beltrão e Samarone Lima, jornalista e autor do livro “Zé – José Carlos Novais Da Mata Machado, Uma Reportagem”, para o qual pesquisou os documentos de Mércia Albuquerque e a entrevistou.
O espetáculo, que já passou por Rio de Janeiro, Porto Alegre e fará apresentações em Uberlândia, Belo Horizonte e Recife, terá também uma versão cinematográfica, dirigida por Maurício Farias, com direção de arte de Luciane Nicolino e participação de Chico Beltrão.
SERVIÇO
‘Lady Tempestade’
Onde: Teatro FAAP
Endereço: Rua Alagoas, 903 – Higienópolis – São Paulo – SP
Telefone: (11) 3662-7233
Quando: de 8 de agosto a 5 de outubro
Horários: Sexta e Sábado, às 20h | Domingo, às 17h
Duração: 70 minutos
Classificação: 12 anos
Capacidade: 501 lugares
Ingressos:
Plateia e mezanino – R$ 160 (inteira) | R$ 80 (meia)
Cadeiras no palco (24 lugares) – R$ 200 (inteira) | R$ 100 (meia)
Vendas online: www.faap.br/teatro
Bilheteria: de quarta a sábado, das 14h às 20h | Domingo, das 14h às 17h
FICHA TÉCNICA
Lady Tempestade – com Andrea Beltrão
Direção: Yara de Novaes
Dramaturgia: Sílvia Gomez
Cenografia: Dina Salem Levy
Desenho de luz: Sarah Salgado e Ricardo Vívian
Figurinos: Marie Salles
Criação e operação de trilha sonora: Chico Beltrão
Desenho de som: Arthur Ferreira
Assistente de direção: Murillo Basso
Assistente de cenografia: Alice Cruz
Identidade visual: Fábio Arruda e Rodrigo Bleque | Cubículos
Fotografia: Nana Moraes
Assessoria de Comunicação: Vanessa Cardoso | Factoria Comunicação
Assessoria de Imprensa: Daniella Cavalcanti
Produção: Boa Vida e Quintal Produções
Direção de produção: Verônica Prates
Coordenação de projetos: Valencia Losada
Produção executiva: Camila Camuso e Bruno Mros
AGENDA NACIONAL DO ESPETÁCULO
• Rio de Janeiro: 09 de janeiro a 27 de abril – Teatro Poeira
• Porto Alegre: 1º a 04 de maio – Teatro Simões Lopes Neto (Multipalco Eva
Sopher)
• São Paulo: 30 de maio a 6 de julho – Sesc Consolação (Teatro Anchieta)
• Uberlândia: 12 e 13 de julho – Theatro Municipal
• Belo Horizonte: 02 e 03 de agosto – Sesi Minas
• São Paulo: 08 de agosto a 05 de outubro – Teatro FAAP
• Recife: 21, 22 e 23 de novembro
• Rio de Janeiro: janeiro de 2026