As pessoas por trás dos nomes icônicos da literatura brasileira, em muitas vezes, são vistas como heroínas. De acordo com o pesquisador Carlos Costa, a imagem que passam de nossos escritores é de pessoas de outro planeta, intangíveis, perfeitas, semideuses. “Nada disso é verdade! São feitas de carne e osso, da mesma matéria que a nossa“, afirma o autor do livro Escritores são humanos: histórias cotidianas da literatura brasileira. A obra conduz os leitores pelos bastidores das vidas dos ícones da literatura brasileira para mostrar que, por trás de seus feitos extraordinários, há pessoas comuns.
Talvez você conheça Mário de Andrade por ter publicado Macunaíma. Mas sabia que, além de gostar de carnaval e cachaça, ele adorava seus sobrinhos e promovia as brincadeiras nos eventos da família? Aliás, você lembrava que Euclides da Cunha, consagrado por Os Sertões, foi morto após um crime passional? Até hoje ninguém tem certeza sobre quem era o verdadeiro culpado. Estes acontecimentos curiosos — para não dizer fofoca — são narrados com detalhes no livro de Carlos Costa. Portanto, a vida de Machado de Assis, um dos artistas mais famosos da literatura brasileira, também foi exporta pelo pesquisador.
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No livro Escritores são humanos, Carlos Costa conta que Machado de Assis era ciumento. “E muito! Não permitia que a esposa participasse das conversas com os poucos amigos que lhes visitavam. Só aos muito íntimos consentia que apertasse a mão e isso mesmo, nem sempre“, escreveu o pesquisador na obra. Machado de Assis e Carolina Augusta se casaram no dia 12 de novembro de 1869. Aliás, é sabido que o artista era extremamente apaixonado por sua esposa: não é à toa que suas cartas endereçadas à esposa foram assinadas como Machadinho.
Outra característica de Machado exposta por Calos Costa foi o vício em jogo — o que deixava o autor de Esaú e Jacó bem estressado, diga-se de passagem. A conversa fiada e as partidas de gamão e xadrez aconteciam sempre na casa da família Smith Vasconcelos “‘Seu’ Machado, como era chamado, vinha de capa, chapéu coco à mão, guarda-chuva no braço. O traje era costumeiramente correto e conservador. Andava sempre de preto, o que lhe dava um ar soturno. Enquanto dona Carolina e a baronesa conversavam baixinho ou cochilavam na varanda, o marido jogava com a família Smith, inclusive com as crianças, coisa que adorava fazer”, escreveu o autor.
Em seguida, Carlos Costa ainda explicou que, na verdade, as partidas mais disputadas ficavam por conta dos dois amigos, Machado e José Smith de Vasconcelos, quando jogavam gamão. “Ninguém queria perder, julgando-se cada um o melhor. Ranzinza e nervoso, Machado demorava-se, muito hesitante nas jogadas“, contou o pesquisador no livro. Aborrecido por causa do jogo, às vezes, o nervoso autor de Memória Póstumas de Brás Cubas ainda ficava ‘de mal’ com o colega. Segundo Carlos, Machado de Assis ficava dias sem aparecer na casa da família Smith. Porém, por causa do vício, não conseguia ficar muito tempo afastado e logo voltava a rever seus parceiros de jogatina.
Outro ponto da vida de Machado de Assis abordado por Carlos Costa em Escritores são humanos: histórias cotidianas da literatura brasileira foi a epilepsia. Aliás, as convulsões eram praticamente a única coisa que transformava os momentos agradáveis das noites de jogos em preocupação — além do estresse do romancista. “Quando as pressentia [crises epilépticas], Machado dizia: ‘Carolina, vou sentir-me mal!’ Ela então lhe dava um copo d’água, que de tanto o marido ranger os dentes na convulsão arriscava quebrá-lo. O sr. Smith mandava as crianças saírem da sala”, explicou Carlos Costa. Depois, ele ainda acrescentou: “Machado ficava descansando até voltar para casa apoiado por dona Carolina. Ele não queria que ninguém os acompanhassem“.
Segundo Carlos Costa, ao longo da escrita do livro, algo chamou sua atenção sobre a vida de Machado de Assis: o fato de ele, apesar de não branco, pobre do Morro do Livramento, filho de um pintor de casas e de uma lavadeira, ter ascendido socialmente sem sofrer muito preconceito racial ou social. Em entrevista à coluna Gabriel Sorrentino – EM OFF, Carlos Costa resgatou falas do escritor Alfredo Pujol. “O seu trato era de uma candura, de uma singeleza, de uma cortesia, de uma meiguice que encantavam todos os seus amigos. Nunca de seus lábios saiu uma palavra áspera ou grosseira. Não contrariava ninguém”, parafraseia Carlos.
Apesar de não considerar o autor de Quincas Borba escandaloso, Carlos Costa confessou ter se impressionado com a relação de Machado com sua madrasta. “O romancista evitava falar sobre sua origem humilde. Nesse contexto, ele a teria evitado. Para Lúcia Miguel Pereira, talvez sua maior biógrafa ao lado de R. Magalhães Júnior, Machado a abandonara por vergonha, por ela ser pobre e mulata. Mas não existe consenso entre os biógrafos quanto a isso“, explica o estudioso.
Para Carlos Costa, portanto, Machado de Assis poderia ter sido ‘cancelado’ por internautas caso vivesse no era da internet. “Afinal, [sua história] se relaciona com um tema sensível e atualíssimo. Como se sabe, Machado de Assis na realidade não era branco como a história quis mostrar. Ele era mulato. Mas o que parece é que ele fugia dessa condição. Ele tinha uma questão não resolvida com sua mestiçagem. Oswald de Andrade escreveu em suas memórias que ‘o grande Machado o que queria era se lavar das mazelas atribuídas à sua ascendência escrava’”, argumenta o autor de Escritores são humanos.
O post Ciúme excessivo, vício em jogo e epilepsia: o que não te contaram sobre Machado de Assis apareceu primeiro em EM OFF.