Com a morte do funkeiro Mr. Catra, neste domingo (dia 9), aos 49 anos, várias personalidades se manifestaram nas redes sociais, destacando a importância do músico carioca. Entre os artistas que prestaram uma homenagem ao cantor está Caetano Veloso, que tornou-se amigo de Catra e publicou um texto no Facebook em que conta como conheceu o funkeiro, além de outros histórias.
A publicação também conta com um vídeo em que a dupla canta uma versão de “Vaca profana” no programa “Bagulho Doido”, apresentado por Mr. Catra no Multishow em 2016.
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“É um caso existencial que o Brasil deveria amadurecer para estudar. O povo e tantos de nós amadurecemos para amar. 32 filhos. Muita coisa para ser vivida em apenas 49 anos”, afirma Caetano no texto que pode ser lido abaixo, na íntegra:
“Quando, nos anos 90, o [filme] ‘Orfeu’ de Cacá Diegues ficou pronto, fomos exibi-lo em Vigário Geral e no Vidigal. Em Vigário, houve um show em que eu cantava canções que compus para o filme e, representando o som de rap e funk das favelas que (para desgosto de Kenneth Maxwell) pontuava suas cenas, subiram ao palco MV Bill e Mr. Catra. Havia uma tela grande ao ar livre para projeção e um palco adjacente. Quando eu fui anunciado, um número simpático de moradores se aproximou e pude ver algumas caras atentas entre os que me ouviam.
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Quando Bill foi anunciado, houve aplausos mais intensos e cresceu muito o número de espectadores frente ao palco. Mas a multidão se multiplicou e delirava ao grito do nome de Mr. Catra. Muita gente vinha dos barracos, gente que nem tinha se abalado para vir ver o filme. Fiquei fã de Bill, cuja música já conhecia, impressionado com sua beleza, elegância e integridade. E Catra, que eu desconhecia totalmente, me fascinou para sempre. Fiquei amigo tanto de Bill quanto de Catra. Com Bill tenho tido mais colaboração e parceria. Mas Catra foi uma série de surpreendentes revelações. Sua voz, suas conversas, suas histórias, sua vida, sua obra. Em Vigário Geral ouvi coisas que vieram a ser conhecidas como funk proibidão.
Depois ouvi de Catra autobiografia em que ele, criado por família branca de classe média, resolveu, adulto, ir viver na favela. Mais tarde, fui vê-lo cantar no Paris Café, no Recreio dos Bandeirantes, canções religiosas hebraicas sobre base eletrônica, entre damas da noite de salto alto e sem roupa. Seu amor por Israel era imenso. Sua visão da história era ousada e problematizada pessoalmente (“negros é que escravizaram negros e os venderam na costa”; “não precisamos de cotas mas de reencontrar a nobreza negra”; “não vou votar em ninguém em 2018: do jeito que tá hoje, me arrependo de ter lutado pela redemocratização”).
Teve vida poligâmica organizada. Ele representava coisas essenciais do ethos das periferias urbanas brasileiras. E era um cara alto astral, que sabia gostar de viver. É um caso existencial que o Brasil deveria amadurecer para estudar. O povo e tantos de nós amadurecemos para amar. 32 filhos. Muita coisa para ser vivida em apenas 49 anos”.