Cantor e compositor co-fundador do movimento tropicalista que promoveu o flerte da música popular mais conservadora com as distorções do rock progressista, a música típica nordestina e os temas de protesto acoplados ao títulos juvenis da Jovem Guarda, Gilberto Gil sempre foi figura adepta aos mais diversos experimentos musicais.
O artista se jogou no reggae de Bob Marley (1945-1981), no pop axé baiano de Ivete Sangalo e Daniela Mercury, no rap de MV Bill e, recentemente, mergulhou nas ondas da black music contemporânea ao erguer pontes com a cantora Iza, sem contar suas parcerias com roqueiros clássicos como Os Paralamas do Sucesso e com a então estrela em ascenção Anitta.
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Por esse caráter tropicalista e cosmopolita, qualquer parceria estabelecida entre Gilberto Gil e um artista da nova geração não deve ser lida como surpreendente, uma vez que o velho baiano é uma das figuras mais adeptas ao pluralismo cultural (o que lhe rendeu cargo como Ministro da Cultura do primeiro governo de Luís Inácio Lula da Silva, entre 2003).
Entretanto, nem mesmo a veia plural e mutante de Gil é possível de explicar a estranheza da live agendada pelo serviço de streaming Globo Play para o dia 13 de junho, sábado, no qual o autor de clássicos como Palco e Drão cai no universo da música de São João ao lado de Juliette Freire, advogada e maquiadora vencedora da 21ª edição do reality show Big Brother Brasil.
Participante com fã clube expressivo capaz de tirar da competição um franco favorito popular, o economista Gilberto Nogueira, Juliette Freire é figura carismática e popular capaz de movimentar mutirões a favor de sua trajetória em um jogo televisionado, entretanto, a despeito das ambições da gravadora Sony Music e da própria Anitta, que empresaria a ex-BBB, Freire não é artista com voz talhada para o canto, tampouco pavimentou caminhos musicais que lhe credenciam dentro de cenário musical já amplamente inflado por artistas de sonoridade volátil.
E, pelo andar da carruagem, é neste balaio pop de caráter descartável que deve seguir a carreira de cantora da ex-BBB a menos que desenvolva uma linguagem própria e uma sonoridade que, mesmo contando com a ajuda de um bom produtor, a tirem da mira do frívolo mercado musical pop tupiniquim.
É claro que a popularidade da ex-BBB é fator decisivo numa live patrocinada por uma empresa de comunicação que a tem em seu casting principal e pretende utilizá-la, e contar com um medalhão como Gilberto Gil ao lado é o apelo perfeito à apreciação crítica e à construção da imagem de uma cantora séria e comprometida com sua carreira.
Entretanto, enquanto não construir seu próprio som com a personalidade de uma música própria, Juliette Freire corre o risco de não ser nada senão uma cantora como tantas outras que, no país das grandes vozes, surge e desaparece sem deixar um rastro de poeira no cintilante universo das estrelas pop do Brasil. Quem viver…