Assim que notícias vindo da Venezuela revelaram dificuldades de usuários da Binance em
acessar a plataforma, um importante debate se reacendeu. Afinal de contas, que tipo de
proteção as pessoas que investem em criptomoedas possuem contra instabilidades
políticas e econômicas como a vivida pelo país vizinho?
Entre aqueles menos afeitos às particularidades do ecossistema cripto, existe uma noção
geral (e equivocada) de que esse tipo de ativo contempla, por si só, um grau de segurança
muito maior do que outros, como poupança, renda fixa, ações ou fundos imobiliários, para
ficar em exemplos mais populares. Mas não é bem assim. Esse grau de segurança, como
veremos adiante, vai estar diretamente relacionado à forma como as criptomoedas vão ser
armazenadas pelo investidor.
Para saber mais sobre o tema, conversamos com Ana Paula Rabello, contadora e
influenciadora especializada em tributação de criptoativos, fundadora do blog Declarando
Bitcoin e autora do e-book Como declarar Bitcoin e outros Criptoativos, referência na área.
Ana Paula explica, inicialmente, que as diferentes maneiras de armazenamento trazem
vantagens e desvantagens:
Não existe uma forma correta de armazenar criptomoedas. Cada uma delas traz vantagens
e desvantagens, cabendo ao investidor escolher aquela que melhor atende às suas
necessidades. Isso vai depender se é um holder (que vai permanecer com o ativo por muito
tempo) ou um trader (que busca resultados em curto prazo), assim como do próprio perfil
pessoal do investidor (conservador, moderado ou arrojado).
Alerta, todavia, que deixar os ativos em corretoras (exchanges) expõe o investidor em
cenários de instabilidade:
As corretoras, como qualquer agente do sistema financeiro, estão sujeitas às dinâmicas do
mercado, bem como a regulações e intervenções estatais. Portanto, ao deixar criptomoedas
sob a custódia de um terceiro, o investidor corre uma série de riscos de perder seus ativos,
que vão desde a falência da empresa, até ataques hacker e, em cenários mais extremos, a
confiscos ou congelamentos de acessos implementados por entidades estatais.
E exemplifica:
Já vimos exchanges como FTX e CoinFlex em situação de falência ou bloqueando
solicitações de saques. Já ocorreram, também, ataques hacker a empresas como
CoinCheck, Coinmama, KuCoin, BitMart e Ronin Network, cujo prejuízo, somado, chegou a
casa dos 1,6 bilhões de dólares, além do vazamento de dados de usuários. E casos
recentes, como o da Venezuela e da Colômbia (cujo presidente aventou a possibilidade de
confiscos à moda Collor/Zélia) demonstram como jamais estamos à salvo de intervenções
econômicas extremas feitas pelo Governo.
Sobre os fatores de instabilidade, lembra que não atuam de forma isolada:
É sempre importante lembrar que as condições de mercado, que podem levar uma
corretora a quebrar, são diretamente afetadas por contextos políticos, econômicos e sociais.
É um efeito cascata. Em novembro de 2021, por exemplo, o bitcoin estava cotado próximo
dos US$39 mil. Com a invasão da Ucrânia pela Rússia, em fevereiro de 2022, o preço
disparou, chegando a mais de US$47 mil, no pico, iniciando uma descendente, já em abril,
que só foi interrompida em novembro, a partir da falência da FTX. Então, está tudo
interligado. Acontecimentos externos relevantes vindos do outro lado do mundo podem
balançar o mercado, levando investidores mais sensíveis a correrem para liquidar suas
posições. E essa corrida desenfreada pode, por vezes, desestabilizar ou até mesmo
quebrar uma corretora.
Para Ana Paula, a maneira mais segura de manter criptomoedas a salvo de todos esses
riscos é mantê-los em carteiras digitais (wallets):
Existe um clichê no mundo cripto que diz que se não são suas chaves, não são suas
moedas (not your keys, not your coins). Quando você deixa suas moedas em corretoras, as
chaves para acessá-las não ficam à sua disposição. Ou seja, quem tem as chaves tem o
controle sobre os ativos, da mesma forma como expõe esses ativos aos riscos do seu
funcionamento (falência, ataques hacker e intervenções estatais). Se as criptomoedas, por
outro lado, ficam armazenadas em wallets (principalmente as cold wallets, que não ficam
conectadas à rede) a única coisa que separa o investidor de seus recursos são as senhas
(seed phrases), que, ainda assim, precisam ser cuidadosamente guardadas e protegidas.
E conclui:
Armazenar criptomoedas é sempre um binômio entre segurança e praticidade. Ou seja,
quanto mais seguro for esse armazenamento, mais dificuldade terá o investidor para fazer
esse ativo circular e vice-versa. Muitas vezes, por exemplo, vai ser necessário jogar essa
criptomoeda de volta em uma exchange para ser possível, então, convertê-la em moeda
fiduciária. É preciso, assim, que o usuário avalie muito bem que tipo de uso ele dará às
suas moedas, para definir que tipo de armazenamento será o mais adequado para cada
caso. Ainda assim, é possível dizer, com bastante segurança, que quanto menos tempo
esses ativos permanecerem em corretoras, menos risco correrá o investidor.
Reprodução / Internet
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