Entre os ecos pulsantes do Carnaval, uma história de fé e conquista foi tecida na trama festiva da maior metrópole brasileira. Filha de Oxóssi e Iansã, em 2024, Mc Trans decidiu trilhar pela primeira vez o sagrado caminho da Avenida do Samba em São Paulo. Aliás, após 10 anos sem comemorar o Carnaval, a cantora não apenas estreou no Sambódromo do Anhembi mas também transcendeu as expectativas e pôde erguer o prêmio da Liga Independente das Escolas de Samba de São Paulo. O Grêmio Recreativo Estrela do Terceiro Milênio desfilou no último dia 11 e foi campeão do Grupo de Acesso 1. Em 2025, portanto, a escola de samba irá desfilar no Grupo Especial do Carnaval paulista.
Em um desfile repleto de cores e ritmos, Mc Trans foi destaque em um carro alegórico. Há quem diga, aliás, que a famosa foi pé-quente e, por isso, o troféu foi parar no Grajaú, região onde fica a quadra da escola de samba escolhida pela cantora. “A sorte quem trouxe pra minha vida foram eles. O sagrado já sabia que eles iriam ganhar. Pelo esforço, pela união, pela fidelidade, pela força que a escola tem e que a comunidade do Grajaú unida levou pra avenida. Pela bateria maravilhosa, pela comissão de frente, pelo casal de mestre sala e porta bandeira. Estar ali foi um presente do sagrado“, disse Mc Trans com exclusividade à coluna Gabriel Sorrentino – EM OFF.
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Em 2014, prestes a estrear na Avenida do Samba, Mc Trans precisou abrir mão do Carnaval. Porém, por um motivo urgente. “Há uma década, meu filho recebeu um diagnóstico que teria problemas psiquiátricos, que não teria noção das coisas“, revelou a famosa. Em seguida, ela continuou a explicar: “Se visse um filme de super herói, ele abriria a janela e pularia porque ele não teria noção. E seria muito difícil criar ele, ele não poderia estudar. Ele passou por vários psiquiatras e todos diziam a mesma coisa“. Religiosa, então, decidiu recorrer à sua fé. “Até que fiz uma promessa…“, acrescentou a famosa. Para garantir a cura do seu filho, Mc Trans prometeu à espiritualidade que se afastaria do Carnaval por 10 anos.
Em conversa com a coluna, Mc Trans continuou a explicar sua relação com o maior espetáculo do planeta após firmar o compromisso com sua religiosidade. “Então, eu não assistia a desfiles, não ia a blocos, não fazia show no Carnaval. Eu me isolava de tudo o que tinha a ver com Carnaval. Eram dias de retiro meu com minha família junto. Misteriosamente, graças à minha fé, ao meu sagrado e a Deus primeiramente… Do nada, esse milagre aconteceu: ele fez outros exames, não precisou tomar mais medicamentos, se curou, estudou, se tornou um profissional. Um filho que só me deu orgulho“, revelou.
Após uma década desviando de qualquer relação com o Carnaval, Mc Trans já tinha entrado em ‘modo automático’. “Para mim, ainda demoraria um ano a dois para cumprir a promessa“, confidenciou a cantora. Depois, ela ainda continuou: “Até que chegou um momento, neste ano, em que Maria Navalha [entidade de Umbanda] chegou no meu terreiro e falou para comemorar sim o Carnaval. Já estava em cima dos desfiles… Então, eu não pensei que desfilaria numa escola de samba“.
Segundo a famosa, enquanto estava no período de restrição do Carnaval devido à promessa, foi sondada por inúmeras muitas escolas de samba. “Tenho amigas estilistas que fazem minhas roupas para show e que também fazem para o Carnaval. Muitos fãs meus coreografam comissão de frente. Porém, eu recusava os convites e não ia“. Porém, no dia seguinte à liberação feita por Maria Navalha, um amigo de Mc Trans a convidou para assistir ao ensaio da sua escola.
“Quando eu cheguei na escola [Estrela do Terceiro Milênio], o que me chocou é que tinha uma mulher trans na área de destaque. Não só uma. Mais de uma. Geralmente, colocam uma trans lá em cima do carro porque ela pagou uma fantasia muito cara. A escola não investe, a trans que se ferra”, denunciou Mc Trans. “E ali, na Estrela do Terceiro Milênio, não era assim. O respeito e o carinho dos héteros e pessoas cisgêneras com os LGBTs, e principalmente as mulheres trans, me chamou muita atenção já no primeiro dia“.
Ao ser convidada para desfilar na escola de samba, Mc Trans topou imediatamente. Aliás, foi pelo carnavalesco Murilo Lobo que a cantora descobriu que, na avenida, homenagearia um orixá. Inclusive, um orixá muito especial em sua vida: “Era Iansã. Eu sou de Oxóssi e Iansã. E a minha [entidade Maria] Navalha trabalha na linha de Iansã. Tudo foi se encaixando. E eu entendi que o meu carnaval já estava separado por eles. É porque eu cumpri a promessa“. Mc Trans ainda foi além: “Na apuração, cada nota 10 que a escola recebia tinha um significado simbólico dos meus 10 anos afastada do Carnaval“.
Depois, ela ainda continuou: “A vitória me trouxe a lembrança de tudo o que eu fiz, tudo o que eu abdiquei. Aliás, também me fez pensar em como a espiritualidade me colocou na melhor escola que eu poderia estar. É uma escola que faz pela comunidade, que acredita nas crianças, traz ensinamentos. É muito unida. E eu sou muito carente de família… Eu senti que fui recebida e acolhida por todos dessa quebrada“, desabafou Mc Trans, que ainda revelou ter se preparado rigorosamente para o desfile. “Tive que fazer um presente [a Iansã], tive que perguntar na minha religião, fazer jogos, tomar banho antes, ir de contra-egum [elemento de proteção comum nas religiosidades de matrizes africanas]“, acrescentou.
“Uma mulher trans homenagear um orixá, principalmente uma guerreira como Iansã, para mim é um marco. É uma quebra de tabu e uma forma de dizer para algumas casas religiosas de matriz africana que orixá conhece o nosso coração“, disse Mc Trans. Em seguida, a cantora continuou a abrir o coração. “‘Ah, mas nasceu homem e como que vai vestir baiana dentro de um terreiro?’ O orixá sabia, muito antes de escolher essa religião, quem eu era, quem eu sempre fui. Se o orixá não conhece a pessoa que ele rege, não faz sentido acreditar nessa religião. Orixá é amor, é carinho e ele nos ama como somos. Então, homenagear Iansã foi surpreendente“, concluiu a famosa.
O Carnaval mal acabou. Porém, para Mc Trans, os preparativos para 2025 devem começar o quanto antes: “O que não pode faltar no meu 2024 é aula de samba. Estou apaixonada pela Terceiro Milênio. Me encantei pelo Carnaval. Eu nunca me envolvi em política, eu não gosto de política, mas o Silvão Leite [diretor responsável da escola de samba Estrela do Terceiro Milênio] faz um trabalho muito lindo na comunidade. Eu vi de perto. Então, quero mergulhar e me preparar para o Carnaval de 2025 com minha escola. Ano que vem, a gente se vê na Globo!“, disparou Mc Trans.
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